segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

RECORDAR A PRIMEIRA MOSTRA ARTES E OFÍCIOS EM ALMADA NO ANO DE 1999,LEVADA A CABO PELA ASSOCIAÇÃO AMIGOS CIDADE DE ALMADA


As costureiras Maria  Emília Frois(direita) e Lila Alves.
"Almada era um concelho com substânciais carências económicas,fundamentalmente agrícola e falho de indútrias obrigava a que as suas gentes procurassem a subsistência em tarefas ocasionais.
Só a partir da segunda metade do século passado se começaram a desenvolver algumas indústrias e por influência disso o incremento de alguns oficios.De entre os muitos já existentes em Almada,antes da industrialização do concelho,as costureiras já tinham as suas tradições no mundo do trabalho e na vida social de Almada.
Mas é a partir da industrialização e consequentemente do aparecimento da máquina de costura que a costureira moderniza os seus métodos de trabalho o que ajuda a produzir mais obra em menos tempo.
Estava acabado o tempo da costureira artesã do dedal e da agulha e em seu lugar aparece a costureira especializada na feitura de camisas de homem,Costureira de alfaiate,Costureira de fato de macaco,vulgo ganga,usada pelos operários industriais,
As costureiras desta banda disputavam com as suas colegas de Lisboa o trabalho encomendado pelos grandes armazéns da capital,e mantinham com elas uma grande rivalidade profissionais.
É de destacar o contributo dado pelo Movimento Associativo na formação  profissional das costureiras ao fomentar cursos de Corte e Costura,com atribuição de diplomas.Sabe-se que,nas décadas de 40 e 50,a SFUAP desenvolveu grande atividade nessa formação, diplomando inúmeras costureiras."

O Pavilhão da Escola D.António da Costa, em Almada foi palco da Primeira Mostra Artes e Ofícios, levada a efeito pela Associação Amigos da Cidade de Almada, entre os dias 19 a 27 de junho de 1999,e que teve o apoio da Camara Municipal de Almada, com demonstrações ao vivo de Oleiro,Tanoeiro,Cesteiro, Calafate, Costureira, Ferreiro, Corticeiro, Pescador(redes),Troço de Mar, Ferrador, Funileiro, Amolador, Carpinteiro de Machado e Calceteiro.

Remonta aos primórdios da História da Humanidade e necessidade de o Homem criar os seus próprios instrumentos e utensílios de modo a permitir-lhe substituir e ultrapassar os diversos e naturais obstáculos no sentido de poder garantir a sua sobrevivência.

Ainda sem perspectiva de Futuro - os perigos, quer animais quer dos próprios Elementos da Natureza a que estava permanentemente expostos eram o seu angustiante dia a dia.Perante a inevitabilidade de os combater,o Homem entendeu que, primeiro em grupo, mais tarde em Associações(organizado)( era o embrião do movimento associativo que desbrochava),os seus interesses melhor seriam defendidos, pois que isolado, a sua vulnerabilidade ser-lhe-ia preconcemente fatal.

A ideia imperativa de se construir em grupo torna-se assim fundamental para sobreviver, sendo condição determinante à sua menor ou maior longevidade,

Durou milénios até que os homens evoluissem e se organizasse, formando pequenas comunidades.


A  arte de Oleiro aqui a ser representada por Francisco Mateus.
"... Oleiro - A cerâmica é a arte de fabricar louça de barro ou matéria análoga; sendo a olaria a oficina onde se fabrica toda a variedade de objetos em barro.
Perde-se no tempo e na memória dos homens o aparecimento desta velha arte e do artifíce que com as suas mãos modela e dá forma a muitos utensílios que vemos ou usamos no nosso quotidiano; as panelas, os pratos, púcaros,canecas,etc;ou ainda a telha,o tijolo e o ladrilho,e também as figuras decorativas com motivos de trabalho,regionais e religiosos,
Os seus instrumentos de trabalho são o forno,onde modela as peças,as masseiras, para amassar o barro,e o forno para a cozedura da obra depois de seca..."
A tradição dos oleiros no Concelho de Almada é muito antiga.Há referencias destes artifíces na nossa terra muito antes da fundação da nacionalidade. Em 1821,há memória de fornos de telha e tijolo no Ginjal.
O oleiro mantém ainda as práticas oficionais de tempos muito antigos: conforme refere o escritor Manuel Mendes:

"... Primeiro lança e espalha no prato do torno uma mancheia de cinza,para que depois de rodada a peça se solte sem dificuldade. Posto o barro, dá-se-lhe quatro apertões de mão,dois fortes socos e logo o engenho  se põe a girar,crescendo de entre os dedos ágeis do oleiro a forma equilibrada e bojuda de uma infusa..." 


Esta tomada de consciência desenvolve-se,cria e fortalece raízes solidificando-se, ganhando corpo e expressão atingindo em plena Idade Média a sua materialização com a institucionalização das Confrarias de das Associações de Mesteres.

As diversas actividades - artesanais de cariz rural e familiar proliferam substancialmente a partir do Século X111, dando então lugar às Artes e Oficios Urbanos, que passam a ser comercializados,reconvertendo algumas Confrarias em Associações de Mesteres,já como forma de regulamentar diferentes ofícios.



Os mesteres, tanoeiros, carpinteiros, latoeiros, ourives, tecelões, oleiros e outros dirigem agora as respectivas produções, especificam qualidades, elaboram tabelas de preços e acordam salários , regulamentando ainda as condições de acesso às profissões dos pequenos artifices e oficiais.

O Tanoeiro Joaquim Pereira Pedro, aqui numa demonstração da arte
Hoje  quase inexistente no concelho de Almada ,o tanoeiro foi em tempos uma figura influente no mundo de trabalho,em Almada.
Há noticias da sua maior importância em toda a nossa região,desde o séculoXVII até aos principios do nosso século.
Em Almada um concelho agrícola,cuja principal cultura era o plantio da vinha, a qual originava vinhos de superior qualidade que eram cobiçados não só internamente,como também no estrangeiro,daí haver a necessidade de recipientes para o seu acondicionamento e transporte. Por isso a importãncia do mister de tanoeiro na confecção e reparação das pipas,dornas, tonéis,barris, etc,
Os instrumentos usados pelo tanoeiro para a construção daquele vasilhame são: o maço,tais, marreta, raspilha, serra de folha. Utiliza várias madeiras  sendo o Castanho e o Carvalho as preferidas pela sua qualidade.


Para além do domínio que exerciam nas Associações,os mesteres  estabeleciam regras,impunham multas e integravam os Governos das urbes onde se inseriam as suas actividades.

Por essa época, nas Sociedades Ocidentais os homens organizavam-se, trabalhavam e viviam em função de grupos,familiar, religioso ou profissional,

Na verdade, esta estrutura de Sociedade rural-artesanal e pré - industrial não concebia o trabalho como actividade autónoma e abstracta perante as demais dimenções da vida, assumia-se como fonte de toda  a Cultura Popular. Era uma vida comunitária em que toda a apendizagem e socialização dos bens se fazia pela convivência e pelo trabalho alicerçados pelas  relações de vizinhança e de ajuda recíproca.

O  ferrador Valdemar Rosa, morador nas Casas Velhas, Monte de Caparica, aqui numa demonstração a ferrar o cavalo.

O Ferrador  era uma figura conhecida em todos os sítios do nosso país.Nas aldeias,nas vilas e cidades todos aqueles que possuíam animais necessitados de ser ferrados procuravam a oficina oua banca do mestre ferrador,para que ele  coma sua sabedoria do oficio  calçasse as bestas. E ele, profundo conhecedor da sua função,punha numa tarefa arriscada toda a sua coragem e perícia no tratamento dos animais.

O mestre ferrador,antes de iniciar o trabalho,prende o animal e estuda-o entendimento.Olha-o primeiro,a seguir passa-lhe a mão pelo dorso e só depois se arrisca a entalar uma das patas entre as pernas, Começa então a tarefa de retirar com a turquês os cravos das ferraduras velhas. Isto feito inicia o desbaste do casco com o formão: é uma tarefa morosa e de muitos cuidados para não ferir o animal. Depois com as ferraduras novas, que preparou na forja e na bigorna, ultimo o acto de ferrar.


Desde então, trabalho e arte estão para sempre ligados.Mas também a festa e o convivio estão presentes. São as festas,as Romarias e os Serões. São as danças,os cantares e o Teatro Popular. Era uma vida em que o sobreviver e o conviver ganham significado humano numa profunda solidariedade entre si,

Depois vem a Revolução.Primeiro a Revolução Industrial "Séculos XVIII e XIX", logo após e como natural consequência a transformação do binómio Sócio - Económico da vida humana. Vem a máquina,a tecnologia,o conhecimento cientifíco,a revolução das mentalidades com novas culturas em oposição à tradição secular do mundo rural, É a marcha imparável e incansável do ser humano na procura de mais e de melhor...e longos e longos anos na pesquisa e busca do possivelmente inatingível. Eis-nos no limiar de novo Milénio,na era dos computadores e das tecnologias avançadas e do que mais adiante se verá?!...

Cipriano Rodrigues e Manuel Traça numa demonstração de carpinteiro de machado.
"... Carpinteiro de machado ou da Construção Naval, assim chamado porque emprega nos seu trabalho entre outras ferramentas,o machado apropriado ao aparelho de mastros...".
Almada nasceu junto ao rio e do mar,e, naturalmente, a sua história faz-se com a luta das suas gentes na procura dos caminhos da sobrevivência,sendo o mar e o rio as estradas que melhores destinos lhe ofereciam. Por essa razão não é de estranhar que, desde os primórdios da sua função,as gentes de Almada tenham nascido artífices e grandes mestres nas artes da construção naval. De entre estes, o carpinteiro de machado é operário imprescindível na construção e reparação de qualquer tipo de embarcação.
Ele, com as suas mãos,ajudadas pela enxó de cabo e outras ferramentas como o machado,a plaina, o cepilho,os formões e as goivas, dá forma aos vários elementos de madeiraque constituem um barco.



E porque a Associação Amigos da Cidade de Almada,tem como função a defesa do património da Cidade de Almada,quer na preservação dos seus valores humanos,culturais e artísticos, quer ainda na transmissão desses mesmos valores à população mais jovem da nossa cidades sobretudo ás  gerações vindouras,torna-se para nós condição fundamental encetar um ciclo de  exposições de Artes e Oficíos com demonstrações ao vivo, cujo aspeto pedagógico é quanto a nós do maior interesse.

Na intensa procura de alimentos para a sua sobrevivência,o homem, em contacto com a natureza,encontrou nos rios e lagos o fruto para a sua alimentação - o peixe e fez-se pescador.

A necessidade de pescar levou-o a construir o arpão e a fisga.Depois o anzol primitivo que consistia num pedaço de pau afiado nas suas extremidades,mais tarde as redes e o covo de vime.Ao mesmo tempo começa a construir barcos muito frágeis e rudimentares, sem capacidade para adentrar-se no mar, procurando,por isso, os lagos e os rios e aventurando-se,algumas vezes,na costa.

A memória das artes piscatóricas em Almada remonta ao século 1 da nossa era,prova disso é a descoberta em Cacilhas de tanques para salga de peixe que se supões datarem do dominio Romano. No séculoXII quando Almada passa para o dominio Cristão,no reinado de D.Sancho 1 a pesca é já importante para a economia da vila. Há referencias dos barcos,dos pescadores e mercadores de peixe.Emmeados do século XVII, encontram-se instalados na Costa de Caparica grupos de pescadores do Algarve e da zona da ria de Aveiro,

O pescador Manuel Francisco no conserto de redes

"... Á medida que nos aproxima-mos da actualidade,a pesca concelhia tende a conformar-se à actividade artesanal, de peso irrelevante no concelho.
Permaneceu como referências de ordem cultural diversos aparelho de pesca; as redes de amalhar fundeadas, as armadilhas, os aparelhos de anzol, as xávegas,as ganchorras e alguns tipos de embarcações tradicionais - os saveiros,as chatas e os botes. E sobretudo permanece o homem - a figura vernácula do pescador da Costa de Caparica  e da Fonte da Telha..."
 
Fonte; Extraído do folhete:Primeira Mostra Artes e Oficíos
Fotos: Joaquim Candeias