domingo, 5 de janeiro de 2025

Memórias da Indústria Naval

 

Partilhamos algumas memórias exposta no Museu Naval,através dos testemunhos de quem participou numa parte da história que marcou a identidade social, económica e cultural do concelho. Uma homenagem a quem trabalhou nas empresas que tornaram Almada uma referência nacional da indústria naval na segunda metade do século XX.

Ao longo desta publicação, convidamo- lo a descobrir os testemunhos reunidos no Museu Naval, instalado no antigo armazém de moldes, que outrora pertenceu à Companhia Portuguesa de Pesca, situado na frente ribeirinha de Olho de Boi,junto ao Jardim do Rio. 

Perservando a memória de um passado recente, a exposição. "Na Rota do Progresso: A indústria Naval em Almada", aberta ao público desde o final de Maio de 2012, partilha uma importante parte da história da Indústria Naval no concelho de Almada.

Dos objectivos aos testemunhos de quem trabalhou num dos mais importantes Pólos da indústria naval no nosso país, ao longo do percurso pelo museu somos transportados para uma época emblemática da história do concelho.

Aqui, ainda se ouvem os sons característicos de uma indústria constituídas por muitas profissões e consolidada ao longo de várias décadas pelo trabalho e dedicação de milhares de operários.

Através de um espólico único, são transmitidas às gerações mais novas competências e memórias das gentes que laboraram, árduamente, uma vida inteira na construção e reparação naval.

 

UM TERRITÓRIO, CINCO EMPRESAS

"Foi um período extraordinário da história portuguesa" conta Augusto Flôr, 56 anos, eletricista naval  na Sociedade de Reparações de Navios entre 1970 e 1979.O complexo industrial naval em Almada incluiu, durante, o século XX Foi um período extraordinário da história portuguesa três grandes estaleiros - a Parry & Son, o Arsenal do Alfeite e a Lisnave - e duas empresas de reparação naval - a Companhia Portuguesa de Pesca(CPP) e a Sociedade Reparação de Navios(SNR). Todas elas foram pioneiras na utilização de materiais e técnicas e na organização do trabalho industrial e, por terem empregado milhares de trabalhadores, alteraram por completo a estrutura social e a dinâmica do território, tornando-se indissociável da cidade de hoje temos "a primeira embarcação portuguesa em ferro,foi construída em Almada, no Cais do Ginjal o navio chamava-se Belém" avança Augusto Flôr.


AMIGOS DO MUSEU NAVAL

 Empenhado em continuar ligado a este património, em novembro de 2011. Augusto Flor decidiu constituir com outros 15 antigos colegas de todas as empresas da indústria naval em Almada, a Associação dos Amigos do Museu Naval (AAMN).

Perservar a identidade sociológica e antropológica deste território junto ao rio Tejo, apoiando e divulgando o Museu Naval, é o objectivo da associação, que teve como mentor Raul Pereira de Sousa "uma figura notável do nosso concelho que esteve ligado à indústria como arquiteto naval, fundador do Sociedade Espeleologia, velejador, profundo conhecedor das artes de navegar e das artes de construir" , como explica o presidente da AAMN.

"A sociedade civil também tem um papel importante na preservação desta  história, sobretudo num concelho onde o associativismo tem tanta força", adianta Augusto Flor. "Estamos a fazer recolha de materiais para o próprio museu. Há pessoas que representam testemunhos importantes sobre a indústria e já não têm tempo". Temos de ser rápidos, precisos e coerentes porque há um património importante que se pode perder", defende.


Dedicação à arte

"Comecei por me apaixonar pela praia e pelo mar e por tudo quanto estava ligado aos navios no periodo da Segunda Guerra Mundial, umas vezes com o meu pai, outras com os rapazes da minha idade", conta António de Almeida, 83 anos, caldeireiro ns Parry& Son, entre 1946 e 1989. "Era um trabalho muito pesado.Era preciso gostar muito daquela profissão". Apesar da sua fisionomia magra, para António de Almeida,"era uma brincadeira, uma alegria" descreve. "Entrei para  lá em miúdo. Aquilo era a minha vida. Éramos como uma familia. Havia muita camaradagem, ajudávamo - nos muito".

Apesar da média de idades ser elevada e a tecnologia obsoleta, nestas empresas faziam-se construções e reparações exemplares. A explicação reside "na capacidade, na imaginação e no conhecimento dos operários que, muitas vezes, construíam as ferramentas necessárias para fazer o trabalho", desvenda Augusto Flor. " Éramos nós que faziamos as ferramentas de fundição ao nosso jeito.Cada peça o seu significado",conta Jorge Serra,antigo fundidor da Companhia Portuguesa de Pesca.

Para Augusto Flor, o período em que trabalhou ns SRN " foi o mais marcante da minha vida. Nesse espaço de tempo( 1970 - 1979),casei e fui pai pela primeira vez.  Cumpri o serviço militar obrigatório e fui alfabetizador no Centro de Alfabetizaçã da SRN", afirma orgulhoso.

"Hoje vivemos numa sociedade de competição, naquela altura existia uma sociedade de cooperação. A sociedade era tão generosa que nós dávamos tudo" garante Augusto Flor.

 

LUTAS E CONQUISTAS

"Entrei  na Companhia Portuguesa de Pescas em 1966, com apenas 14 anos, como aprendiz de fundição, profissão que desempenhei durante cerca de 20 anos", conta Jorge Serra, 60 anos."Naquela  altura não existia vestuário nem calçado adequado, nem segurança no trabalho.Depois do 25 de Abril de 1974 houve uma mundança das condições de trabalho, de higiene e dos salários" adianta o antigo fundidor da CPP. Ideia partilhada por Augusto Flor, para quem "os trabalhadores da Indústria Naval de Almada foram uma alavanca ao nível da melhoria das condições dos outros trabalhadores do país".

"Houve grandes lutas operárias. As conquistas eram apontadas como exemplo para as outras empresas", complementa Joaquim Candeias, montador de andaimes na Lisnave entre 1973 e 2000.

 

Além da vertente laboral, há uma importante componente social associada a estas empresas. "Todas estas empresas tinham Grupos Desportivos e Casas de Pessoal, que eram um prolongamento da atividade profissional.Isto fomentava a camaradagem e a coesão social",assegura Augusto Flor.


O Apogeu e declínio

" A industria naval em Almada teve um peso muito grande. Os postos de trabalho direto chegaram a ser acima de 15 mil", afirma Augusto Flor. "A industria naval teve uma importância tal na qualificação das pessoas que o primeiro presidente da Câmara Municipal de Almada no regime democrático foi um operário do Arsenal do Alfeite e o atual presidente da Assembleia Municipal foi funcionário da Lisnave", adianta o antigo operário da Sociedade Reparações de Navios.

Também Joaquim Candeias,60 anos,à semelhança de muitos trabalhadores da indústria naval, teve contato com o meio operário muito cedo."Quando entrei para a Lisnave em 1973, senti a força da classe operária e a importãncia que ela tinha. O movimento operário e a vida que dava ao Ginjal era enorme, era um vaivém de pessoas, dava vida a esta zona de Cacilhas. Hoje é angustiante passar por esta zona ribeirinha e ver a degradação do  então foi local de trabalho e sustento para muitas famílias".


"Ao meio dia, em Cacilhas, só se viam fatos de ganga. Vinhamos comer a Almada ou a Cacilhas. Havia muita vida junto ao rio.Agora, de manhã veem-se as pessoas a correr para o trabalho e à noite  a regressar. E também há turistas. Tudo é diferente" adianta António Almeida. A partir da  década de 80 do século XX inicia-se a lenta e continuada desindustrialização do concelho, com o encerramento ou deslocalização dos estaleiros e das grandes empresas a eles ligados.

 

"O desmantelamento da Lisnave na década de 80, tocou-me profundamente, tal como a outros colegas,ao ver partir os gindastes em cima de batelões, uns para o Estaleiro da Mitrena, em Setúbal e outros para o estrangeiro"conta Joaquim Candeias.


"O que mais me custou foi subir aquela ladeira pela última vez, em 1984.....quando me lembro disso.Ainda tenho amigos dessa época que encontro de vez em quanto.Tive muita pena quando tudo acabou.O gosto que tínhamos na arte. E hoje não há", diz emocionado Jorge Serra.

Quando em 2000 a Lisnave encerrou o estaleiro, na Margueira, Joaquim Candeias, que já trabalhava em Setúbal, regressou à Lisnave para esvaziar os cacifos. "Quando lá cheguei e comecei a tirar o que ainda restava vieram-me à memória as recordações e chorei tal como outros colegas.Era parte da minha vida que ali estava. Foi ver o passado desaparecer". Ainda hoje,quando partilha este momento se emociona.

 

Recordar o passado

Visívelmente comovido e com a voz embargada, Artur Oliveira, 73 anos, serralheiro na Companhia Portuguesa de Pesca, entre 1956 e 1984, conta: "Quando visitei pela primeira vez a exposição relembrei muitas memórias desses tempos.Arrepiei-me. Vim para aqui ainda garoto. Dei o meu contributo, tal como outros trabalhadores, para que esta empresa fosse viável. É algo que nos marcou para o resto da vida.Aqui travámos muitas lutas, demonstrámos  o nosso empenho e dedicação.Havia trabalhos altamente dolorosos".

"Quando aqui entrei senti um grande choque.Foi a primeira vez que desci esta  ladeira a pé, como antigamente, ao fim de quase 30 anos.Foi uma sensação única", confessou Jorge Serra. Já Joaquim Candeias realça " o empenho da autarquia na ampliação do Museu Naval, para perpétuar parte da  nossa história". O antigo operário da industria naval de Almada foram uma alavanca ao nível da melhoria das condições dos outros trabalhadores do país".

"Houve grandes lutas operárias.As conquistas  da Lisnave eram apontadas como exemplo para outras empresas", complementa Joaquim Candeias, montador de andaimes  Lisnave, entre 1973 e 2000.

Além da vertente laboral, há uma importante componente social associada a  estas empresas. "Todas

 - e duas empresas de reparação naval - a Companhia Portuguesa de Pesca(CPP) e a Sociedade Reparação de Navios(SNR). Todas elas foram pioneiras na utilização de materiais e técnicas e na organização do trabalho industrial e, por terem empregado milhares de trabalhadores, alteraram por completo a estrutura social e a dinâmica do território, tornando-se indissociável da cidade de hoje temos "a primeira embarcação portuguesa em ferro,foi construída em Almada, no Cais do Ginjal o navio chamava-se Belém" avança Augusto Flôr.

 

 

??Neste post partilhamos algumas memórias exposta no Museu Naval,através dos testemunhos de quem participou numa parte da história que marcou a identidade social, económica e cultural do concelho. Uma homenagem a quem trabalhou nas empresas que tornaram Almada uma referência nacional da indústria naval na segunda metade do século XX.??

Ao longo das próximas páginas convidamo-lo a descobrir os testemunhos reunidos no Museu Naval, instalado no antigo armazém de moldes, que outrora pertenceu à Companhia Portuguesa de Pesca, situado na frente ribeirinha de Olho de Boi,junto ao Jardim do Rio. Perservando a memória de um passado recente, a exposição, a exposição. "Na Rota do Progresso: A indústria Naval em Almada", aberta ao público desde o final de Maio de 2012, partilha uma importante parte da história da Indústria Naval no concelho de Almada.

Dos objectivos aos testemunhos de quem trabalhou num dos mais importantes Pólos da indústria naval no nosso país, ao longo do percurso pelo museu somos transportados para uma época emblemática da história do concelho.

Aqui, ainda se ouvem os sons característicos de uma indústria constituídas por muitas profissões e consolidada ao longo de várias décadas pelo trabalho e dedicação de milhares de operários.

Através de um espólico único, são transmitidas às gerações mais novas competências e memórias das gentes que laboraram, arduamente, uma vida inteira na construção e reparação naval.

 

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AMIGOS DO MUSEU NAVAL

 Empenhado em continuar ligado a este património, em novembro de 2011. Augusto Flor decidiu constituir com outros 15 antigos colegas de todas as empresas da indústria naval em Almada, a Associação dos Amigos do Museu Naval (AAMN).

Perservar a identidade sociológica e antropológica deste território junto ao rio Tejo, apoiando e divulgando o Museu Naval, é o objectivo da associação, que teve como mentor Raul Pereira de Sousa "uma figura notável do nosso concelho que esteve ligado à indústria como arquiteto naval, fundador do Sociedade Espeleologia, velejador, profundo conhecedor das artes de navegar e das artes de construir" , como explica o presidente da AAMN.

"A sociedade civil também tem um papel importante na preservação desta  história, sobretudo num concelho onde o associativismo tem tanta força", adianta Augusto Flor. "Estamos a fazer recolha de materiais para o próprio museu.Há pessoas que representam testemunhos importantes sobre a indústria e já não têm tempo". Temos de ser rápidos, precisos e coerentes porque há um património importante que se pode perder", defende.


Dedicação à arte

"Comecei por me apaixonar pela praia e pelo mar e por tudo quanto estava ligado aos navios no periodo da Segunda Guerra Mundial, umas vezes com o meu pai, outras com os rapazes da minha idade", conta António de Almeida, 83 anos, caldeireiro ns Parry& Son, entre 1946 e 1989. "Era um trabalho muito pesado.Era preciso gostar muito daquela profissão". Apesar da sua fisionomia magra, para António de Almeida,"era uma brincadeira, uma alegria" descreve. "Entrei para  lá em miúdo. Aquilo era a minha vida. Éramos como uma familia.Havia muita camaradagem, ajudávamo-nos muito".


Apesar da média de idades ser elevada e a tecnologia obsoleta, nestas empresas faziam-se construções e reparações exemplares. A explicação reside "na capacidade, na imaginação e no conhecimento dos operários que, muitas vezes, construíam as ferramentas necessárias para fazer o trabalho", desvenda Augusto Flor. " Éramos que faziamos as ferramentas de fundição ao nosso jeito.Cada peça o seu significado",conta Jorge Serra,antigo fundidor da Companhia Portuguesa de Pesca.

Para Augusto Flor, o período em que trabalhou ns SRN " foi o mais marcante da minha vida. Nesse espaço de tempo( 1970 - 1979),casei e fui pai pela primeira vez.  Cumpri o serviço militar obrigatório e fui alfabetizador no Centro de Alfabetizaçã da SRN", afirma orgulho.

"Hoje vivemos numa sociedade de competição, naquela altura existia uma sociedade de cooperação. A sociedade era tão generosa que nós dávamos tudo" garante Augusto Flor.

 

LUTAS E CONQUISTAS

"Entrei  na Companhia Portuguesa de Pescas em 1966, com apenas 14 anos, como aprendiz de fundição, profissão que desempenhei durante cerca de 20 anos", conta Jorge Serra, 60 anos."Naquela  altura não existia vestuário nem calçado adequado, nem segurança no trabalho.Depois do 25 de Abril de 1974 houve uma mundança das condições de trabalho, de higiene e dos salários" adianta o antigo fundidor da CPP. Ideia partilhada por Augusto Flor, para quem "os trabalhadores da Indústria Naval de Almada foram uma alavanca ao nível da melhoria das condições dos outros trabalhadores do país".

"Houve grandes lutas operárias.As conquistas eram apontadas como exemplo para as outras empresas", complementa Joaquim Candeias, montador de andaimes na Lisnave entre 1973 e 2000.

Além da vertente laboral, há uma importante componente social associada a estas empresas. "Todas estas empresas tinham grupos desportivos casas de pessoal que eram um prolongamento da atividade profissional.Isto fomentava a camaradagem e a coesão social",assegura Augusto Flor.


O Apogeu e declínio

" A industria naval em Almada teve um peso muito grande. Os postos de trabalho direto chegaram a ser acima de 15 mil", afirma Augusto Flor. "A industria naval teve uma importância tal na qualificação das pessoas que o primeiro presidente da Câmara Municipal de Almada no regime democrático foi um operário do Arsenal do Alfeite e o atual presidente da Assembleia Municipal foi funcionário da Lisnave", adianta o antigo operário da Sociedade Reparações de Navios.

Também Joaquim Candeias,60 anos,à semelhancia de muitos trabalhadores da indústria naval, teve contato com o meio operário muito cedo."Quando entrei para a Lisnave em 1973, senti a força da classe operária e a importãncia que ela tinha. O movimento operário e a vida que dava ao Ginjal era enorme, era um vaivém de pessoas, dava vida a esta zona de Cacilhas. Hoje é angustiante passar por esta zona ribeirinha e ver a degradação do  então foi local de trabalho e sustento para muitas famílias".

 "Ao meio dia, em Cacilhas, só se viam fatos de ganga. Vinhamos comer a Almada ou a Cacilhas. Havia muita vida junto ao rio.Agora,de manhã veem-se as pessoas a correr para o trabalho e à noite e regressar. E também há turistas.Tudo é diferente", adianta António Almeida.

A partir da década 80 do século XX , inicia-se a lenta e continuada desindustrialização do concelho, com o encerramento ou deslocalização dos estaleiros e das grandes empresas ligadas."O  desmantelamento dos estaleiros da Lisnave na década 80, tocou-me profundamente, tal como a outros colegas, ao ver partir os guindastes em cima de batelões,uns para o Estaleiro de Mitrena e outros para o estrangeiro" conta Joaquim Candeias.

 




 

 








 

 






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